sereio viagem ll

fui a lisboa. a viagem foi lenta. demorada. o percurso cheio de pessoas. depois da viagem, cheguei ao que parecia ser o possível início da mesma. mas já não era. parei para comer um daqueles bolos com cereja no topo. por favor, queria um iced tea de limão. queria porquê? já não quer? ah? desculpe? já não quer? ah, sim quero... e para comer? não quero nada, obrigado. fui para o primeiro destino, na altura único e final. o espaço era caótico, vestígios de destruição por toda a parte. sentia-se a presença de um animal. o espaço estava insuportável. saí. tinha que encontrar outro destino. percorri um caminho que ora era familiar ora não. deixei-me conduzir. não sabia por onde ia. sabia apenas que tinha um destino. lisboa pode ser um espaço assustador. quando cheguei ao que sabia ser o fim, fiquei em silêncio. não sabia onde estava. mas era ali. os eucaliptos, os pinheiros, as placas de cortiça dominadas pelas raízes. um espaço ordenado apesar de deixado ao acaso há tempo suficiente para transpirar uma agradável sensação de tempo. fiquei por lá. já nem me lembro o que fiz para ocupar o tempo. lembro-me apenas de ter fome e comer qualquer coisa. antes explorei um pouco as coisas, acho. fome saciada acabei sentado. fumei todo o tabaco que tinha a tentar ver as estrelas por entre as nuvens. apenas se ouviam as cigarras. devia estar longe de qualquer zona urbana. apesar do som electrónico que acompanhava as cigarras. um som em tudo essencial. chegou gente. uma rapariga. sotaque estrangeiro. falei com ela sobre hitchcook. mas estava cansado. fui-me deitar. para ganhar sono, pensei no que tinha visto. lembrei-me de um pequeno pónei, rosa e amarelo. com apontamentos de azul, preto e branco. esqueci-me do vermelho na pata magnética. acabei por adormecer ao som dos ruídos electrónicos. as cigarras estavam já longe. ou caladas. acordei e o som electrónico ainda estava lá. a rapariga não. as cigarras não. as estrelas não. e aí senti o meu braço a ser conduzido. fiquei aterrado. não era nada, mas podia ser tanto. podia ser tudo. lembrei-me do que me tinham dito em tom de segredo antes da viagem. vai com calma. deixei-me ir. e apercebi-me que essa força esteve sempre lá. antes de ir a lisboa. durante a viagem. nos destinos. e agora tinha o meu braço junto ao seu centro. ainda tremo de pânico quando penso nisso. o dia 24 acabou por chegar. voltei a casa. mas nunca mais o mesmo. nunca mais. vai com calma.


ele convidou-me para ir a casa dele. eu aceitei. não sei porquê. não sei porque aceitei. não sei porque me convidou. fui. mais tarde do que combinado. mas fui. não falámos durante muito tempo da razão pela qual o convite tinha surgido. nem porque aceitei. apenas constatámos como era positivo, à falta de melhor termo, o facto de ter ido. tentámos lidar da melhor maneira com isso. não esperava ter que ir tão cedo a lisboa. nem sei muito bem se a viagem devia ter sido evitada. mas o que conta é a intenção, não é? de certa forma, tentámos fugir ao inevitável. assumimos que se tinha ido tudo estava bem. a intenção, certo? as tentativas foram várias… todas infrutíferas pois nenhuma afastava a necessidade de perguntar porque me convidaste? porque aceitaste o convite? chegámos a falar nisso muito por alto antes de tentarmos subir os 39 degraus que nos levariam às respostas. estava preocupado contigo…eu estaria muito diferente se tivesse que vir cá. não sei porquê. não estou bem, mas hei-de ficar, já to tinha dito. é desconfortável… o quê? estares aqui? não. estares preocupado comigo. devias estar concentrado em ti, não em mim. apercebi-me que ele não percebeu esta conversa. não percebeu que estar roto e desfeito por dentro não implica estar a apodrecer por fora. isso surge se não se fizer nada, mas eu vim a lisboa, estou a desinfectar-me. mas a intenção está latente. logo, tudo está bem, sim? acabámos por deixar de rodeios, sobretudo porque nenhum dos dois aguentava mais. estava preocupado contigo, mas não estou mais. pedi para vires cá porque queria estar contigo agora que vais começar uma nova contagem. pois, eu acredito em tudo o que te disse… não tens que te preocupar… e vim porque… porque és uma pessoa madura… não! porque não posso permitir que uma nova contagem me afecte demasiado. nisso somos diferentes… e em mais coisas, senão que estaria a fazer aqui? fiquei com dúvidas se esta conversa tinha sido completamente compreendida. se quiseres, posso dar-te um abraço. ele entendeu. depois do abraço, pensei nas palavras que me tinham dito antes da primeira viagem. vai com calma. e apercebo-me que ir com calma implica ir não necessariamente na direcção escolhida. apenas ir. pensei que a contagem tinha terminado. enganei-me. sem intenção, claro.

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